quarta-feira, 17 de setembro de 2008

TEORIA GERAL DOS SISTEMAS

Aluno: Fernando Alves Michalak – TGSN

 

Introdução

O nível de conexões /relacionamentos das ciências, ou seja, tornaram-se amplamente interligadas entre elas, de tal modo que hoje se possui a necessidade de um estudo sobre os padrões desses complexos. A teoria geral de sistemas vem com o objetivo de suprir essa necessidade, criando teorias sobre os sistemas/complexos.

Em física, sabe-se bem que os enormes progressos realizados nas ultimas décadas engendraram também novos problemas que evidenciariam melhor aos leigos no numero indefinido de centenas de partículas elementares das quais a física atualmente não pode dar explicações nem razões. O mesmo ocorre com a biologia ao fracionar o código genético para tentar novas descobertas sobre o funcionamento dos seres vivos, uma vez que o adequado é se estudar os complexos ou sistemas gerados por essas seqüências de genes.

O significado da teoria geral de sistemas

Uma conseqüência da existência de propriedades gerais dos sistemas é o aparecimento de semelhanças estruturais ou isomorfismos em diferentes campos. Por esse motivo, conceitos, modelos e leis similares apareceram muitas vezes em campos bastante diferentes, independentemente e com base em fatos totalmente diferentes.

Mas a teoria de sistemas não consiste na procura por vagas e superficiais analogias, pois ao lado das semelhanças entre fenômenos podem também ser sempre encontradas dessemelhanças. O isomorfismo de que se aqui se trata é muito mais que a mera analogia. É uma conseqüência do fato de, sob certos aspectos, poderem ser aplicadas abstrações correspondentes e modelos conceituais a fenômenos diferentes. Isto não difere do procedimento geral da ciência.

Ao analisarmos sistemas encontramos dois tipos: sistemas abertos e sistemas fechados.

Sistemas fechados são considerados sistemas isolados de seu ambiente. Em contrapartida sistemas abertos são aqueles que são analisados com sua interação com o seu ambiente.

Outro ramo estreitamente ligado à teoria dos sistemas é o da moderna teoria da comunicação. Pois a noção geral na teoria da comunicação é a de informação. Em muitos casos o fluxo de informação corresponde a um fluxo de energia, entretanto, podem ser apresentados facilmente exemplos nos quais a informação é transmitida sem fluxo de energia ou nos quais a informação é transmitida sem fluxo de energia ou de matéria.

Houve uma mudança na ciência nas ultimas décadas. Tínhamos uma ciência mecanicista, nascida na física clássica do século xix, a qual tinha por principio a divisão do todo em partes cada vez menores para se entender o todo, esse método também é conhecido como método cartesiano. Tendo esse modelo como não adequado para todos os sistemas, nasce a ciência moderna visando compreender o todo por meio da analise dos relacionamentos, ou seja, dos complexos/sistemas que essas partes/frações constituem.

Uma característica da ciência moderna é o surgimento de novos campos da ciência de noções tais como totalidade, holístico, organísmico, gestalt, etc., significando que, em ultima instancia, temos de pensar em termos de sistemas elementos em interação mútua.

O conceito de organização também era algo pendente no mundo mecanicista, pois em biologia, os organismos são por definição, coisas organizadas. Embora tenhamos uma imensa soma de dados sobre a organização biológica, da bioquímica à citologia, à histologia e à anatomia, não temos uma teoria da organização biológica, isto é, um modelo conceitual que permita a explicação dos fatos empíricos.

São características da organização que de um organismo vivo que de uma sociedade noções como as de crescimento, diferenciação, ordem hierárquica, dominância, controle, competição, etc. Estas noções não aparecem na física convencional. A teoria geral de sistema é capaz de tratar dessas matérias.

A função integradora da teoria dos sistemas pode talvez ser resumida da seguinte maneira. Até aqui a unificação da ciência tem sido vista como a redução de todas as ciências à física, a resolução final de todos os fenômenos em acontecimentos físicos. De nosso ponto de vista a unidade da ciência ganha um aspecto mais realista. A concepção unitária do mundo pode ser baseada não na esperança possivelmente fútil e certamente forçada de reduzir por fim todos os níveis da realidade ao nível da física, mas antes isomorfia das leis em diferentes campos. Falando a linguagem que tem sido chamada de modo “formal”, isto é, considerando as construções conceituais da ciência isto significa uniformidades estruturais dos esquemas que aplicamos. Falando em linguagem “material” significa que o mundo, ou seja, o total de acontecimentos observáveis apresenta uniformidades estruturais, que se manifestam por traços isomórficos de ordem nos diferentes níveis ou domínios.

Chegamos então a uma concepção que, por oposição ao reducionismo, podemos denominar perspectivismo.

A tgs vem propor uma abordagem mais unificada dos problemas científicos, de tal maneira a tornar a educação mais integrada. Pois se vê a necessidade de uma abordagem generalista em campos como a química física, a biofísica, a aplicação da química, da física e da matemática à medicina.

Um argumento freqüentemente usado com relação ao valor da ciência e de seu impacto na sociedade e no bem estar da humanidade é de certo modo o seguinte. Nosso conhecimento das leis da física é excelente e por conseqüência nosso controle tecnológico da natureza inanimada é quase ilimitado. Nosso conhecimento das leis biológicas não está tão adiantado, mas é o suficiente para permitir um bom volume de tecnologia biológica na medicina moderna e na biologia aplicada. Porém o que falta é o conhecimento das leis da sociedade humana e, por conseguinte uma tecnologia sociológica.

No entanto, podemos conceber uma compreensão cientifica da sociedade humana e de suas leis de maneira um tanto diferente e mais modesta. Este conhecimento pode ensinar-nos não somente o que o comportamento humano e a sociedade têm em comum com outras organizações, mas também aquilo em que consiste seu caráter único. Aqui, o dogma principal será: o homem não é somente um animal político, mas é antes e acima de tudo um individuo.

Ao tratar de complexos de “elementos”, podemos fazer três diferentes espécies de distinções, a saber,

1) de acordo com o seu número;

2) de acordo com sua espécie;

3) de acordo com as relações dos elementos.

O significado da expressão um tanto mística “o todo é mais que a soma das partes” consiste simplesmente em que as características constituídas não são explicáveis a partir das características das partes isoladas. As características do complexo, portanto, comparadas às dos elementos, parecem “novas” ou “emergentes”. Porém, se conhecermos o total das partes contidas em um sistema e as relações entre elas o comportamento das partes. Podemos também dizer: enquanto podemos conceber uma soma como sendo composta gradualmente, em um sistema, enquanto total de partes com suas inter-relações, tem de ser concebido como constituído instantaneamente.

Fisicamente, estes enunciados são triviais; mas podem tornar-se problemáticos e conduzir a concepções confusas em biologia, psicologia e sociologia somente por causa de uma interpretação errônea da concepção mecanicista, uma vez que existe a tendência para a resolução dos fenômenos em elementos independentes e cadeias causais, enquanto as inter-relações eram deixadas de lado.

A variação do complexo total é a soma (física) das variações de seus elementos. Podemos chamar este comportamento somatividade física ou independência.

Podemos definir a somatividade dizendo que um complexo pode ser construído, passo a passo, colocando juntos os primeiros elementos separados; inversamente, as características do complexo podem ser completamente analisadas reduzindo-as às dos elementos separados. Isto é verdade para aqueles complexos que podemos denominar “amontoados”, tais como um monte de tijolos ou coisas avulsas, e para as forças mecânicas que atuam de acordo com o paralelograma de forças.

A somatividade em sentido matemático significa que a variação no sistema total obedece a uma equação de forma idêntica às equações das partes. Isto só é possível quando as funções do lado direito da equação contém somente termos lineares, o que é um caso trivial.

Há um outro caso que parece ser pouco comum nos sistemas físicos, mas é freqüente e básico nos sistemas biológicos, psicológicos e sociológicos.

Os sistemas de equações do tipo considerado podem ter três diferentes espécies de soluções. O sistema em questão pode atingir assintoticamente um estado estacionário estável com o passar do tempo; pode nunca chegar a este a este estado; ou pode haver oscilações periódicas.

Em relação à finalidade, se pode distinguir entres alguns tipos como:

Teologia estática ou adequação significando que um arranjo parece ser útil para certo “fim”.

Teleologia dinâmica, significando o caráter direcional dos processos.

Direção dos acontecimentos no sentido de um estado final que pode ser expresso como se o comportamento atual fosse dependente desse estado final. Todo sistema que atinge uma condição independente do tempo comporta-se desta maneira.

Caráter direcional baseado na estrutura, significando que um arranjo de estruturas dirige o processo de tal maneira que é alcançado certo resultado. Isto é verdade naturalmente quando à função das máquinas construídas pelo homem, que produzem resultados ou desempenhos conforme o que é desejado. Na natureza viva encontramos uma ordem estrutural de processos que em sua complicação ultrapassam largamente todas as máquinas construídas pelo homem.

Contudo, há ainda outra base para as regulações orgânicas. É a equifinalidade, isto é, o fato de que o mesmo estado final pode ser alcançado partindo de diferentes condições iniciais e de diferentes maneiras.

Finalmente, há a verdadeira finalidade ou propósito, significando que o comportamento real é determinado pela previsão do fim. Este é o conceito aristotélico original. Pressupõe que a futura meta já esteja presente no pensamento e dirija a ação atual. A verdadeira finalidade é característica do comportamento humano, estando ligada à evolução do simbolismo da linguagem e dos conceitos.

A tgs não é um catálogo de equações diferenciais conhecidas e suas soluções, mas despertam novos e bem definidos problemas, que em parte não aparecem em física, mas tem importância fundamental em campos não físicos. Justamente porque esses fenômenos não são tratados pela física ordinária, tais problemas apareceram muitas vezes como metafísicos ou vitalistas.

A teria geral dos sistemas deveria ainda ser um importante dispositivo regulador na ciência. A existência de leis de estrutura semelhante em diversos campos torna possível o uso de modelos mais simples ou melhor conhecidos para fenômenos mais complicados ou de mais difícil manejo. Por conseguinte, a tgs deveria ser metodologicamente um importante meio para controlar e investigar a transferência de princípios de um campo para outro, a fim de que não seja necessário duplicar ou triplicar a descoberta dos mesmos princípios em diferentes campos isolados uns dos outros. Ao mesmo tempo, formulado critérios exatos, a tgs se precavém contra as analogias superficiais, inúteis na ciência e nocivas em suas conseqüências práticas.

Isto exige uma definição da extensão em que as “analogias” na ciência são permissíveis e úteis.

Há evidentemente três requisitos para a existência de isomorfismos em diferentes campos e ciências. Aparentemente, os isomorfismos das leis repousam de um lado em nosso conhecimento, e de outro lado na realidade. Trivialmente, é fácil escrever qualquer complicada equação diferencial, no entanto mesmo expressões de aparência inocente podem ser difíceis de resolver ou dar, por fim, soluções embaraçosas. O número de expressões matemáticas simples, que serão preferencialmente aplicadas à descrição de fenômenos, que serão preferencialmente aplicadas à descrição de fenômenos naturais, é ilimitado. Por essa razão, leis de estrutura idêntica aparecerão em campos intrinsecamente diferentes. A mesma coisa se aplica aos enunciados em linguagem ordinária. Também aqui o número de esquemas intelectuais é restrito e serão aplicados em domínios completamente diferentes.

Entretanto, estas leis e esquemas seriam de pouco valor se o mundo não fosse tal que as leis e esquemas pudessem ser aplicados a ele.

Em nossas considerações partimos de uma definição geral de “sistema” definido como “um certo número de elementos em interação” e expresso pelo sistema de inequações. Não foi feita hipóteses especiais ou enunciados sobre a natureza do sistema, de seus elementos ou das relações entre estes. Contudo, a partir desta definição puramente formal de “sistema”, derivam muitas propriedades que em parte são expressas em leis bem conhecidas em vários campos da ciência e em parte referem-se a conceitos anteriormente considerados antropomórficos, vitalistas ou metafísicos.

Podemos resumir os principais resultados desta exposição da seguinte maneira:

A análise dos princípios gerais dos sistemas mostra que muitos conceitos considerados antropormóficos, metafísicos ou vitalistas são acessíveis a uma exata formulação. São conseqüências da definição dos sistemas e de certas condições dos sistemas.

Esta investigação é um requisito útil com relação a problemas concretos da ciência. Em particular, conduz à elucidação de problemas que nos esquematismos habituais e na compartimentação dos campos especializados não são considerados. Assim a teoria dos sistemas revelar-se-ia um importante meio no processo de desenvolvimento de novos ramos do conhecimento, fazendo-os chega à condição de ciências exatas, isto é, a sistemas de leis matemáticas.

Esta investigação é igualmente importante para a filosofia da ciência, cujos principais problemas adquirem novos e às vezes surpreendentes aspectos.

O fato de certos princípios aplicarem-se aos sistemas em geral, independentemente de natureza dos sistemas e das entidades em questão, explica o aparecimento de concepções e leis correspondentes em diferentes campos da ciência, independentes uns dos outros, causando notável paralelismo em seu desenvolvimento moderno. Assim, conceitos tais como os de totalidade e soma, mecanização, centralização, ordem hierárquica, estados estacionários e estáveis, equifinalidade, etc., são encontrados em diferentes campos da ciência natural, assim em psicologia e sociologia.

A realidade, na concepção moderna, é vista como uma enorme ordem hierárquica de entidades organizadas, numa superposição de muitos níveis, indo dos sistemas físicos e químicos aos biológicos e sociológicos. A unidade da ciência é conferida não pela utópica redução de todas as ciências à física e à química, mas pelas uniformidades estruturais dos diferentes níveis de realidade.

Acredita-se que a futura elaboração da tgs mostrará ser um grande passo no sentido da unificação da ciência. Pode estar destinada na ciência do futuro a desempenhar um papel semelhante ao da lógica aristotélica na ciência da antiguidade. A concepção grega do mundo era estática, sendo as coisas consideradas reflexos de arquétipos ou idéias eternas. Por conseguinte, o problema central da ciência era a classificação, cujo organon fundamental é a definição de subordinação e superordenação dos conceitos. Na ciência moderna, a interação dinâmica parece ser o problema central em todos os campos da realidade. Seus princípios gerais terão de ser definidos pela teoria dos sistemas.

Os processos realizados na tgs

Existe um certo número de recentes criações destinadas a satisfazer as exigências de uma tgs que podem ser enumeradas como:

A cibernética baseada no princípio da retroação ou dos encadeamentos causais circulares, fornecendo mecanismos para a procura de uma meta e o comportamento autocontrolador.

A teoria da informação, introduzindo o conceito de informação como quantidade mensurável por uma expressão isomórfica da entropia negativa em física e desenvolvendo os princípios de sua transmissão.

A teoria dos jogos, analisando, dentro de uma nova moldura matemática, a competição racional entre dois ou mais antagonistas que procuram o máximo de ganho e a mínima perda.

A teoria da decisão, analisando igualmente as escolhas racionais nas organizações humanas, baseada no exame de determinada situação e de seus possíveis resultados.

A topologia ou a matemática relacional, incluindo campos de natureza não métrica, por exemplo, a teoria das redes e dos gráficos.

A análise fatorial, isto é, o isolamento, por meio da análise matemática, de fatores onde existem múltiplas variáveis, em psicologia e em outros campos.

A tgs em sentido restrito, que procura derivar da definição geral de “sistema” como complexo de componentes em interação, conceitos característicos das totalidades organizadas, tais como interação, soma, mecanização, centralização, competição, finalidade, etc., e aplica-los a fenômenos concretos.

Enquanto a teoria dos sistemas em sentido amplo tem o caráter de uma ciência básica, às vezes mencionada com o nome geral de ciência dos sistemas. Este desenvolvimento está estreitamente ligado à moderna automação. Falando em termos gerias é possível distinguir os seguintes campos:

Engenharia de sistemas, isto é, o planejamento, traçado, evolução e construção científicos de sistemas homem-máquina;

Pesquisa de operações, isto é, controle cientifico dos sistemas existentes, constituídos por homens, máquinas, materiais, dinheiro, etc.;

Engenharia humana, isto é, adaptação cientifica dos sistemas e especialmente das máquinas a fim de obter a máxima eficácia com o mínimo custo em dinheiro e outras despesas.

A inclusão das ciências biológicas, social e do comportamento junto com a moderna tecnologia exige a generalização dos conceitos básicos da ciência. Isto implica novas categorias do pensamento científico, em comparação com as existentes na física tradicional e os modelos introduzidos com esta finalidade são de natureza interdisciplinar.

Um dos importantes aspectos das modernas transformações do pensamento científico é não haver um único “sistema mundial” abrangendo a totalidade das coisas. Todas as construções científicas são modelos que representam certos aspectos ou perspectivas da realidade.

A questão decisiva dos progressos da tgs é a do valor explicativo e antecipador das “novas teorias” ao atacar a multidão de problemas que se agrupam em torno das noções de totalidade, teleologia, etc.

Não se discute que foram abertos novos horizontes, mas as relações com os fatos empíricos permanecem muitas vezes tênues. Assim, a teoria da informação foi saudada com um enorme avanço, mas fora do campo tecnológico primitivo as contribuições continuaram sendo escassas.

Chegamos finalmente àquelas mais altas e mal definidas entidades chamadas culturas e civilizações humanas. É o campo freqüentemente denominado “filosofia da história”. Este nome exprime o propósito de formar um elo entre a “ciência” e as “humanidades”, mais particularmente entre as ciências sociais e a história.

A tgs trouxe uma contribuição à extensão da teoria científica, conduziu a novas intuições e princípios e abriu novos problemas “pesquisáveis”, isto é, capazes de serem objetos de estudos ulteriores, experimentais ou matemáticos. As limitações da teoria e de suas aplicações em seu estado atual são óbvias, mas os princípios parecem ser essencialmente sólidos, conforme demonstra sua aplicação em diferentes domínios.

O organismo considerado como sistema físico

A aplicação dos princípios físico-químicos de equilíbrio, especialmente da cinética química e da lei de ação das massas, mostrou ter fundamental importância para a explicação dos processos fisiológicos.

Considerando-se o organismo como um todo, apresenta características semelhantes às dos sistemas em equilíbrio. Compreende-se imediatamente que pode haver sistemas em equilíbrio no organismo, mas que o organismo enquanto tal não pode ser considerado um sistema em equilíbrio.

O organismo não é um sistema fechado, mas aberto. Dizemos que um sistema é “fechado” se nenhum material entra nele ou sai. É chamado de “aberto” se há importação e exportação de matéria.

Há um contraste fundamental entre os equilíbrios químicos e os organismos que realizam um metabolismo. O organismo não é um sistema estático fechado ao exterior e contendo sempre componentes idênticos. É um sistema aberto em estado quase estável, mantido constante em suas relações de massa dentro de uma contínua transformação de componentes materiais e energias, no qual a matéria entra continuamente vinda do meio exterior e sai para o meio exterior.

Os verdadeiros equilíbrios nos sistemas fechados e os “equilíbrios” estacionários nos sistemas abertos mostram certa semelhança, na medida em que o sistema, tomado como totalidade e do ponto de vista de seus constituintes, permanece constante em ambos os casos. Mas a situação física nos dois casos é fundamentalmente diferente. Os equilíbrios químicos em sistemas fechados baseiam-se em reações reversíveis. Nos sistemas abertos, o estado estável não é reversível em totalidade nem em muitas reações individuais.

Um sistema fechado deve finalmente atingir um estado de equilíbrio independentemente do tempo, definido pela máxima entropia e mínima energia livre, no qual a proporção entre as fases conserva-se constante. Um sistema químico aberto pode atingir um estado estável independente do tempo, no qual o sistema permanece constante em totalidade e em suas fases, embora haja fluxo contínuo de componentes materiais.

Um sistema fechado em equilíbrio não necessita de energia para se conservar, nem é possível a partir dele. A mesma coisa é verdade no que diz respeito a um sistema químico em equilíbrio. Mas não é possível a contínua capacidade de trabalho em um sistema fechado que tente para o equilíbrio logo que possível, somente em um sistema aberto. O aparente equilíbrio encontrado num organismo não é um verdadeiro equilíbrio incapaz de fornecer trabalho, mas ao contraio, é um pseudo-equilíbrio dinâmico mantido constante a certa distância do verdadeiro equilíbrio. É assim capaz de fornecer trabalho, mas, por outro lado, exige contínua importação de energia para manter a distância que o separa do verdadeiro equilíbrio.

Para a conservação do “equilíbrio dinâmico” é necessário que as proporções dos processos sejam harmonizadas. As reações rápidas também no organismo conduzem ao equilíbrio químico. As reações lentas não chegam ao equilíbrio, mas conservam-se em estado estável.

Uma importante característica dos sistemas biológicos é a que se contêm em termos tais como “propósito”, “finalidade”, “procura da meta”, etc.

Um aspecto muito característico da ordem dinâmica nos processos organísmicos é o que pode ser denominado equifinalidade. Os processos que se passam em estruturas de tipo das máquinas seguem um caminho fixo. Conseqüentemente, o estado final será modificado se as condições iniciais ou o curso do processo forem alterados. Por oposição, o mesmo estado final, a mesma “meta” pode ser alcançado partindo de diferentes condições iniciais e por diferentes trajetos nos processos organísmicos.

Se o organismo é um sistema aberto, os princípios que se aplicam geralmente aos sistemas desta espécie devem aplicar-se a ele de modo inteiramente independente da natureza das relações e processos, evidentemente de extrema complexidade, existentes entre os componentes.

As grandes áreas do metabolismo, crescimento, excitação, etc., começam a difundir-se em um campo teórico integrado sob a direção do conceito de sistemas abertos.

O estudo dos fenômenos organísmicos tendo por base a concepção exposta, da qual foram desenvolvidos alguns poucos princípios gerais, já demonstraram sua importância na explicação de fenômenos específicos da vida.

O modelo do sistema aberto

As leis da física não dizem qual a diferença entre um organismo doente e um morto, mas estão interessados nos fatos dos cachorros estarem vivos ou mortos. O processo hormonal é determinado por leis físicas e químicas, nenhum é melhor, mais sadio ou mais normal que o outro.

Habitualmente não temos nenhuma dificuldade em distinguir entre um organismo vivo e um objeto morto. Em um ser vivo, inúmeros processos químicos e físicos acham-se “ordenados” de tal modo que permitem ao sistema vivo perdurar, crescer, etc.

O organismo é uma máquina quimiodinâmica, que transforma diretamente a energia do combustível em trabalho efetivo, fato em que, por exemplo, se baseia a teoria da ação muscular. O organismo tornou-se uma máquina cibernética, capaz de explicar muitos fenômenos homeostáticos e de tipos afins.

O modelo do organismo como máquina tem seus sucessos, mas também tem suas dificuldades e limitações, tais como o problema da origem da máquina, o problema da regulação e a contínua troca de componentes.

O sistema aberto define-se como um sistema em troca de matéria com seu ambiente, apresentando importação e exportação, construção e demolição dos materiais que o compõem. O desenvolvimento da teoria cinética dos sistemas abertos deriva de duas fontes: primeiramente a biofísica do organismo vivo, e secundariamente a evolução da química industrial, que, além das reações em recipientes fechados ou dos processos de fornada, usa de modo crescente sistemas de reações contínuas devido à sua maior eficácia e outras vantagens. A teoria termodinâmica dos sistemas abertos é a chamada termodinâmica irreversível, que se tornou uma importante generalização da teoria física pelo trabalho de alguns cientistas.

Em certas condições os sistemas abertos aproximam-se de um estado independente de tempo, o chamado estado estável. Este estado mantém-se à distância do verdadeiro equilíbrio e, portanto é capaz de produzir trabalho, como se dá no caso dos sistemas vivos, por oposição aos sistemas em equilíbrio. O sistema permanece constante em sua composição, a despeito de contínuos processos irreversíveis, importação e exportação, construção e demolição, estarem em ação. O estado estável mostra características regulatórias notáveis, que se tornam evidentes particularmente em sua equifinalidade. Se um estado for alcançado por um sistema aberto, é independente das condições iniciais e determinado somente pelos parâmetros do sistema, isto é, pelas velocidades de reação e transporte. É isto que se chama equifinalidade, encontrado em muitos processos organísmicos. Por oposição aos sistemas físico-químicos fechados, o mesmo estado final pode ser atingido equifinalmente partindo de diferentes condições iniciais e depois de perturbações de processo.

Do ponto de vista da termodinâmica, os sistemas abertos podem conservar-se em um estado de alta improbabilidade estatística de ordem e organização.

A tendência geral dos processos físicos segue o rumo da entropia crescente, isto é, estados de probabilidade crescente e ordem decrescente.Os sistemas abertos comparados aos sistemas fechados convencionais apresentam características que parecem contradizer as leis físicas comuns, sendo muitas vezes consideradas características vitalistas da vida, isto é, violações das leis físicas, somente explicáveis pela introdução de fatores anímicos ou entelequias no curso dos acontecimentos orgânicos.

Depois da exploração dos caminhos das reações metabólicas individuais, em bioquímica, tornou-se agora uma importante tarefa compreender os sistemas metabólicos integrados como unidades funcionais. O caminho atravessa a química física das reações enzimáticas aplicadas a sistemas abertos. A complexa rede e a interação de grande número de reações foram esclarecidas em funções tais como a fotossíntese, a respiração e a glicólise, sendo a última investigada por um modelo processado em computador, com cerca de cem equações diferenciais não lineares. De um ponto de vista mais geral, começamos a compreender que, além da organização morfológica visível, observada pelo microscópio eletrônico, pelo microscópio luminoso e macroscopicamente, há uma outra organização visível, que resulta da interação de processos determinada pelas velocidades de reação e transporte e defendendo-se contra as perturbações do meio.

Outro campo de investigação é o transporte ativo nos processos celulares de importação e exportação, na função renal, etc. Isto se liga aos potenciais bioelétricos. Só podem ser tratados estes problemas mediante a aplicação da termodinâmica irreversível.

No organismo, o protótipo do sistema aberto é o sangue, com seus vários níveis de concentrações mantidos constantes.

A teoria dos sistemas abertos é parte de uma tgs. Esta doutrina refere-se a princípios que se aplicam aos sistemas em geral, qualquer que seja a natureza de seus componentes e das forças que os governam. Na tgs alcançamos um nível onde não se falam mais de entidades físicas e químicas, mas se discutem totalidades de natureza completamente geral. Contudo, certos princípios dos sistemas abertos continuam sendo verdadeiros e podem ser aplicados com êxito a campos mais amplos da ecologia, que estuda a competição e o equilíbrio entre as espécies, à economia humana e outros campos sociológicos.

A base do modelo do sistema aberto é a interação dinâmica de seus componentes. A base do modelo cibernético é o ciclo de retroação no qual, por via de retroação da informação mantém-se um valor desejado, atinge-se um alvo, etc. A teoria dos sistemas abertos é uma cinética e uma termodinâmica generalizadas. A teoria cibernética baseia-se na retroação e na informação. Os dois modelos foram aplicados com êxito em seus respectivos campos. No entanto, devemos ter a noção de suas diferenças e limitações.

O modelo do sistema aberto na formulação cinética e termodinâmica não fala de informação. Por outro lado um sistema de retroação do ponto de vista termodinâmico e cinético é fechado, não possuindo nenhum metabolismo.

O modelo de retroação aplica-se eminentemente as regulações “secundárias”, isto é, regulações baseadas em arranjos estruturais no sentido amplo da palavra. Como, porém as estruturas do organismo são mantidas em metabolismo e troca de componentes, as regulações “primárias” devem evoluir na dinâmica num sistema aberto. O organismo torna-se crescentemente “mecanizado” no curso do desenvolvimento, e por isso é que as regulações posteriores correspondem particularmente a mecanismos de retroação.

Alguns aspectos da teoria dos sistemas em biologia

De acordo com uma opinião bem difundida, existe uma distinção fundamental entre “fatos observados” de um lado, e por outro a “mera teoria’, produto da especulação mais ou menos suspeito. Quando tomamos dados supostamente simples em nosso campo, levaria horas revelar a enorme quantidade de suposições teóricas necessárias para formar esses conceitos, dispor os convenientes projetos experimentais, criar as máquinas que executam a tarefa, e tudo isto está implicado nos dados supostamente brutos da observação. Depois de ter obtido uma série destes valores, a coisa mais” empírica “que se tem a fazer é apresentá-los em uma tabela de valores médios e desvios padrões”. Isto pressupõe o modelo da distribuição binomial e igualmente a teoria inteira da probabilidade, problema profundo e em grande parte não resolvido da matemática, da filosofia e mesmo da metafísica. Se tivermos sorte os dados podem ser marcados de maneira simples, obtendo-se o gráfico de uma linha reta. Mas, considerando-se a inconcebível complexidade de processos que se passam mesmo numa simples célula, é pouco menos que um milagre o fato do mais simples modelo possível aplicar-se realmente a certo número de casos.

Assim, mesmo os fatos de observação supostamente não adulterados estão já misturados a toda sorte de imagens conceituais, conceitos e modelos, teorias ou quaisquer outras expressões que escolhamos. A escolha não consiste em saber se devemos nos manter no campo dos dados ou fazer teorias, mas consistem entre modelos mais ou menos abstratos, generalizados, mais ou menos afastados da observação direta, mais ou menos convenientes para representar os fenômenos observados.

São citados quatro modelos fundamentais no campo do metabolismo quantitativo. São eles:

Sistemas abertos e estados estáveis;

Retroação e homeostase;

Alometria e regra da superfície;

Teoria do crescimento animal.

Os modelos do sistema aberto e da retroação aplicam-se a uma ampla gama de fenômenos em fisiologia e representam expansões essenciais da teoria física. As duas concepções devem ser claramente distinguidas; o modelo de retroação não deveria ser considerado uma cobertura para a regulação fisiológica em geral ou identificado com a “teoria dos sistemas”.

A equação alométrica representa a relação mais simples possível entre o tamanho do corpo e os processos metabólicos. Tem larga aplicabilidade e exprime a harmonização de processos nos sistemas vivos. Contudo, não existe “lei de superfície” ou “lei da potência ¾” ou “lei da redução progressiva das taxas metabólicas”. A relação alométrica varia enormemente nos fenômenos fisiológicos.

As variações da relação entre o tamanho do corpo e a taxa metabólica podem ter lugar:

Em diferentes tecidos ou em diferentes espécies;

Em conseqüência de alterações das condições fisiológicas;

Devido a diferentes dispositivos experimentais.

Entre as condições que alteram esta relação contam-se fatores como atividades fisiológicas, o sexo, a estação, a prévia aclimação, etc.

A dependência do metabolismo total em relação ao tamanho nos mamíferos é diferente em condições basais, em um ambiente que não esteja em estado térmico neutro e em condições de atividade muscular. As variações seguem a regra de Locker, isto é, com o aumento absoluto da taxa metabólica, a regressão com relação ao tamanho do corpo tende a diminuir.

As equações de crescimento estabelecidas por Bertalanffy representam um modelo altamente simplificado, que no entanto abrange muitos fenômenos e regularidades encontradas na fisiologia do metabolismo e do crescimento. Os parâmetros que aparecem nessas equações foram em muitos casos verificados por experiências fisiológicas.

Tendo em vista as variações da relação tamanho-metabolismo, os chamados tipos metabólicos e tipos de crescimento de Bertalanffy deveriam ser considerados casos ideais, realizáveis em certas condições padronizadas, mais do que características invariáveis das espécies ou grupos de espécies em questão.

Parece haver correspondência entre as variações sazonais das taxas metabólicas e das taxas de crescimento.

O conceito de sistema nas ciências do homem

Considerada à luz da história, nossa tecnologia e mesmo nossa sociedade baseiam-se em uma imagem fisicalista do mundo. A física é ainda o paradigma da ciência, a base de nossa idéia da sociedade e de nossa imagem do homem.

Novas ciências surgiram, as ciências da vida, do comportamento e da sociedade. Exigem o lugar que lhes compete em uma moderna concepção do mundo e seriam capazes de contribuir para uma reorientação fundamental. Menos destacada do que as revoluções contemporâneas na tecnologia, mas igualmente prenhe de possibilidades futuras, é uma revolução baseada nos modernos progressos das ciências biológicas e do comportamento. Pode ser chamada de a revolução organísmica. Seu núcleo é a noção de sistema, aparentemente um conceito pálido, abstrato e vazio, que entretanto é repleto de um significado oculto, de possibilidades de fermentação e explosão.

O alcance desta concepção pode ser resumido em uma curta proposição. O século XIX e a primeira metade do século XX concebiam o mundo como um caos. O caos era o jogo cego dos átomos, freqüentemente citado, que, na filosofia mecanicista e positivista, parecia representar a realidade última, sendo a vida um produto acidental de processos físicos e o espírito um epifenômeno. Era o caos quando, conforme a teoria corrente da evolução, o mundo vivo apareceu como um produto do acaso, resultado de mutações casuais e da sobrevivência, no moinho da seleção natural. No mesmo sentido, a personalidade humana nas teorias do behaviorismo e da psicanálise era considerada um produto casual da natureza e da educação, de uma mistura de genes e de uma seqüência acidental de acontecimentos, desde a primeira infância à maturidade.

Procura-se agora uma outra concepção básica do mundo, o mundo como organização. Esta concepção alteraria de fato as categorias básicas das quais repousa o pensamento científico e influenciaria profundamente as atitudes práticas.

Esta tendência é marcada pela emergência de um feixe de novas disciplinas, tais como a cibernética, a teoria da informação, a tgs, as teorias dos jogos, das decisões, das filas e outras. Na aplicação prática é marcada pela análise dos sistemas, engenharia dos sistemas, pesquisa de operações, etc. São diferentes nas premissas básicas, nas técnicas matemáticas e nos propósitos, sendo freqüentemente insatisfatórias e ás vezes contraditórias. Concordam, porém em tratarem de uma maneira ou de outra, de sistemas, totalidades ou organização e todas elas anunciam uma nova abordagem.

Em que podem esses progressos contribuir para as ciências do homem? Parece uma mixórdia de teorias contraditórias que vão do behaviorismo, para a qual não há diferença entre o comportamento humano e o dos ratos no laboratório, ao existencialismo, para a qual a situação humana está além da compreensão científica. Esta variedade de concepções e enfoques seria de todo salutar se não fosse um fato perturbador. Todas estas teorias têm em comum uma “imagem do homem” que se origina no universo físico-tecnológico, a qual é aceita sem discussão por teorias do universo em outros aspectos antagônicos. Este é o modelo robô do comportamento humano.

Um conceito capital é o de esquema estímulo-resposta. Considera-se que o comportamento, humano ou animal, é uma resposta a estímulos provenientes do exterior. Em parte o estímulo-resposta baseia-se em mecanismos nervosos herdados, como no comportamento reflexo e instintivo. As partes mais importantes no que respeita ao comportamento humano são as respostas adquiridas ou condicionadas. Estas podem ser o condicionamento clássico por meio da repetição da seqüência de estímulos condicionais e incondicionais. Pode ser o condicionamento operante por reforço de respostas bem sucedidas. Ou também pode ser a primitiva experiência infantil. Isto, por conseguinte domina a engenharia psicológica.

A questão é que as regras descobertas pelos teóricos da aprendizagem em experiências animais são consideradas capazes de abranger a totalidade do comportamento humano.

O princípio do ambientalismo diz que o comportamento e a personalidade são formados por influências externas. Esse princípio também diz que a psicanálise sustenta quando diz que a personalidade é formada pela primitiva experiência infantil, especialmente de natureza sexual.

O princípio do equilíbrio ou princípio da estabilidade diz que a função primordial do aparelho mental consiste em manter o equilíbrio homeostático. O comportamento consiste essencialmente na redução das tensões, particularmente as de natureza sexual.

O comportamento é governado também pelo princípio da economia. É utilitário e deveria ser executado de modo mais econômico, isto é, com o mínimo de despesa mental ou vital.

As teorias do conhecimento e da aprendizagem descrevem corretamente uma importante parte ou aspecto do comportamento humano, mas tomadas como teorias que “não são senão isto” tornam-se evidentemente falsas e se destroem a si mesmas em sua aplicação. A imagem do homem como robô é metafísica ou mito, sua força de persuasão repousa unicamente no fato de corresponder tão estreitamente à mitologia da sociedade de massa, à glorificação da máquina e ao lucro como único motor do progresso.

O princípio do stress, tão freqüentemente invocado em psicologia, psiquiatria e psicossomática, exige reavaliação. Como tudo no mundo, o stress é uma coisa ambivalente. O stress não é somente um perigo para a vida, que deve ser controlado e neutralizado por mecanismos adaptativos, mas é também criação de uma vida superior.

O segredo da saúde e da felicidade consiste na adaptação bem sucedida às condições sempre variáveis do mundo. As penalidades pelo fracasso neste grande processo de adaptação são a doença e a infelicidade.

A vida não é confortável instalação em sulcos pré-ordenados do ser. Em sua forma mais perfeita é élan vital, inexoravelmente impelida para uma forma superior de existência. Sem dúvida isto é metafísico e uma imagem poética. Mas o mesmo se dá, afinal de contas, com qualquer imagem que procuremos fazer das forças impulsionadoras do universo.

O novo modelo ou imagem do homem que parece estar imergindo é caracterizado resumidamente como o modelo do homem enquanto o sistema de personalidade ativa.

A tendência geral da psicologia costumava ser a redução dos fatos mentais e do comportamento a um feixe de sensações, impulsos, reações inatas e aprendidas ou qualquer espécie de elementos últimos que fossem teoricamente pressupostos. Por oposição, o conceito de sistema procura colocar um foco no interesse científico o organismo psicofisiológico como totalidade.

Por oposição ao modelo reagente expresso pelo sistema e-r, começa-se a considerar o organismo psicofísico como um sistema primordialmente ativo.

Este conceito aplica-se não somente aos aspectos do comportamento, mas também aos do conhecimento. O homem não é um recebedor passivo de estímulos provenientes do mundo exterior, mas em sentido muito concreto cria seu universo.

Esta nova imagem do homem, substituindo o conceito de robô pelo de sistema, acentuando a atividade imanente em lugar da reatividade dirigida para o exterior, e reconhecendo a especificidade da cultura humana comparada ao comportamento animal deve levar a uma fundamental reavaliação dos problemas na educação, do treinamento, da psicoterapia e das atividades humanas em geral.

Considerando-se a ciência social em sentido amplo, incluindo a sociologia, economia, ciência política, psicologia social, antropologia cultural, lingüística, boa parte da história e humanidades, etc., deve-se entender a ciência como um esforço nomotético, isto é, não uma descrição de singularidades, mas a ordenação dos fatos e a elaboração de generalidades.

A pesquisa dos sistemas de organismos é extensa. Forma uma parte importante da biologia, do estudo da comunidade e sociedades de animais e plantas com seu crescimento, competição, luta pela existência, etc., tanto os aspectos ecológicos quanto nos genéticos.

A sociologia, com seus campos afins, é essencialmente o estudo de grupos ou sistemas humanos. As múltiplas tentativas de fornecer formulações teóricas são todas as elaborações do conceito de sistema ou algum sinônimo deste domínio.

Os conceitos de teorias fornecidos pelo enfoque moderno dos sistemas estão sendo progressivamente introduzidos na sociologia. A atual teoria sociológica consiste em grande parte nas tentativas de definir o sistema sociocultural e no estudo do funcionalismo, isto é, o exame dos fenômenos sociais com relação à totalidade a que servem.

Ao contrário das espécies biológicas que evoluíram mediante a transformação genética, somente a humanidade apresenta o fenômeno da história, que se liga intimamente à cultura, à linguagem e à tradição. O reinado da natureza é dominado por leis progressivamente reveladas pela ciência.

A ciência é essencialmente um empreendimento nomotético, isto é, estabelece leis baseadas no fato dos acontecimentos na natureza serem repetíveis e recorrentes. Por oposição, a história não se repete. Portanto, a história é ideográfica, isto é, uma descrição de acontecimentos que ocorreram no passado próximo ou distante.

O enfoque científico é indiscutivelmente aplicável a certos aspectos da sociedade humana. Um destes campos é a estatística. As estatísticas demográficas, as estatísticas de mortalidade, as sondagens de opinião, as previsões do comportamento dos votantes ou da venda de um produto mostram que os métodos estatísticos são aplicáveis a uma larga escala de fenômenos sociais.

Mesmo para estas entidades misteriosas chamadas valores humanos, estão começando a aparecer teorias cientificas.

Uma coisa que os vários sistemas da “história teórica” parecem ter demonstrado é a natureza do processo histórico. A história não é um processo que se passa numa humanidade amorfa ou no homo sapiens como espécie zoológica. Ao contrário, é suportada por entidades ou grandes sistemas chamadas altas culturas ou civilizações. O número destas é incerto, suas delimitações são vagas e complexas suas interações.

A tgs em psicologia e psiquiatria

Nos últimos anos o conceito de “sistema” vem adquirindo crescente influência em psicologia e psicopatologia. Numerosas pesquisas referem-se à tgs ou alguma parte dela.

A psicologia americana na primeira metade do século XX era dominada pelo conceito do organismo reagente, ou, mais dramaticamente, pelo modelo do homem como robô. Esta concepção era comum a todas as grandes escolas da psicologia americana, a psicologia clássica e o neobehaviorismo, as teorias da aprendizagem e da motivação, a psicanálise, a cibernética, o conceito de cérebro como computador e assim por diante. Conforme disse um dos principais teóricos, o homem é um computador, um animal ou uma criança. Seu destino está completamente determinado pelos genes, instintos, acidentes, condicionamentos e reforços primitivos, forças culturais e sociais. O amor é um impulso secundário baseado na fome e nas sensações orais ou uma formação de uma reação a um ódio inato subjacente. Na maioria de nossas formulações perscnológicas não há condições para a criatividade, não há margens aceitas de liberdade para voluntárias, nem adequado reconhecimento do poder dos ideais, nem base para ações altruístas, nem há absolutamente fundamento para qualquer esperança de que a raça humana possa salvar-se da fatalidade com que agora se defronta. Se nós, psicólogos, estivermos sempre, consciente ou inconscientemente, tentando por malícia reduzir o conceito da natureza humana a seu mais baixo denominador comum e nos vangloriamos de nosso sucesso nesse modo de proceder, então teremos de admitir que nessa medida o espírito satânico esteja vivo dentro de nós.

Os dogmas da psicologia dos robôs foram extensamente criticados. Contudo a teoria permaneceu dominante por motivos óbvios. O conceito de homem como robô era tanto uma expressão quanto uma poderosa força motora de uma sociedade de massa industrializada.

A sociedade moderna ministrou uma experiência em grande escala de psicologia manipuladora. Se seus princípios são corretos, as condições de tensão e stress conduziriam ao aumento das perturbações mentais. Por outro lado, a saúde mental seria melhorada quando as necessidades básicas fossem satisfeitas, quando a repressão dos instintos infantis fosse evitada pelo livre treinamento das funções corporais, quando as exigências escolares fossem reduzidas a ponto de não sobrecarregarem um tenro espírito, quando a satisfação sexual fosse fornecida numa idade precoce, e assim por diante.

A experiência behaviorista conduziu a resultados contrários a perspectiva. A segunda guerra mundial não produziu aumento das perturbações neuróticas ou psicóticas, excetuados os efeitos de choque diretos, tais como as neuroses de combate. Em contraposição, a sociedade da abundância produziu um número sem precedente de indivíduos mentalmente doentes. Foi precisamente em condições de redução das tensões e de satisfação das necessidades biológicas que apareceram novas formas de perturbação mental, isto é, formas de disfunção mental que se originam não de impulsos reprimidos, de necessidades insatisfeitas ou de stress, mas da falta de significado da vida. Suspeita-se que o recente aumento da esquizofrenia pode ser causado pela “dependência do outro” em que vive o homem na sociedade moderna e não há dúvida que no campo das desordens do caráter, apareceu um novo tipo de delinqüência juvenil, não o crime por desejo ou paixão, mas por brincadeira, para “obter uma excitação” e resultante da vacuidade da vida.

Assim a psicologia teórica quanto à aplicada foi conduzida a uma situação de mal-estar com relação a seus princípios básicos.

A razão do presente interesse na tgs parece ser esperar-se que esta concepção possa contribuir para uma estrutura conceitual mais adequada à psicologia normal e patológica.

Ao contrário das forças físicas como a gravidade ou a eletricidade, os fenômenos da vida são encontrados somente em entidades individuais chamadas organismos. Qualquer organismo é um sistema, isto é, uma ordem dinâmica de partes e processos em mútua interação. Igualmente, os fenômenos psicológicos só se encontram em entidades individuais, que no homem são chamadas personalidades.

O organismo vivo mantém um desequilíbrio chamado estado estável de um sistema aberto e assim é capaz de dispensar potenciais existentes ou tensões na atividade espontânea ou em resposta a estímulos liberadores.

A atividade autônoma é a forma mais primitiva do comportamento. Encontra-se na função cerebral e nos processos psicológicos. A descoberta de sistemas ativadores no tronco cerebral acentuou este fato nos últimos anos. O comportamento natural abrange inúmeras atividades além do esquema e-r, desde a exploração, o jogo e os rituais nos animais até os objetivos econômicos, intelectuais, estéticos, etc. Para a auto-realização e a criatividade no homem. Toda a espécie do comportamento realiza-se por sua própria conta, tirando satisfação do próprio desempenho.

Um sintoma de doença mental é a danificação da espontaneidade. O paciente torna-se cada vez mais um autômato ou uma máquina e-r, impelido por impulsos biológicos, atormentados por necessidades de alimento, eliminação, satisfação sexual, etc. O modelo do organismo passivo é uma descrição muito adequada do comportamento estereotipado dos impulsivos, dos doentes com lesões cerebrais e do declínio da atividade autônoma na catatonia e formas correlatas psicopatológicas. Além disso, estes fatos evidenciam que o comportamento normal é diferente.

A diferenciação é a transformação de uma condição mais geral e homogênea que passa a outra mais especial e heterogênea. Sempre há um desenvolvimento, este caminha de um estado de relativa globalidade e falta de diferenciação para um estado de crescente diferenciação, articulação e ordem hierárquica.

O princípio da diferenciação é encontrado por toda parte em biologia, na evolução e no desenvolvimento do sistema nervoso, comportamento, psicologia e cultura. As funções gerais geralmente progridem de um estado sincrético, no qual as percepções, motivações, sentimentos, etc. Acham-se numa unidade amorfa, para uma distinção cada vez mais clara destas funções. Na percepção o primitivo estado parece ter sido um estado de sinestesia, a partir do qual vão se separando as experiências visuais, auditivas, táteis, químicas e outras. No comportamento animal e em boa parte do comportamento humano há uma unidade perceptivo-emotivo-motivadora.

Os organismos não são máquinas, mas podem até certo ponto tornarem-se máquinas, solidificarem-se em máquinas, nunca, porém completamente porque um organismo inteiramente mecanizado seria incapaz de reagir às condições incessantemente variáveis do mundo exterior. O princípio de mecanização progressiva exprime a transição da totalidade indiferenciada para a função superior, que se torna possível pela especialização e divisão do trabalho. Este princípio implica também perda de potencialidades nos componentes e de regulabilidade no todo.

A mecanização conduz freqüentemente ao estabelecimento de partes dirigentes, isto é, componentes que dominam o comportamento do sistema. Estes centros podem exercer “efeitos de gatilho”, isto é, opondo-se ao principio causa aequat effectum, uma pequena alteração de uma parte dirigente pode, em virtude de mecanismos de amplificação, causar grandes transformações no sistema total. Desta maneira, pode estabelecer-se uma ordem hierárquica de partes ou processos.

Qualquer sistema enquanto entidade que pode ser estudada em si mesma deve ter limites, quer espaciais quer dinâmicos. As fronteiras espaciais só existem na observação ingênua, pois todas as fronteiras são, em última análise, dinâmicas.

Excetuando a satisfação das necessidades biológicas, o homem vive em um mundo não de coisas, mas de símbolos.

O simbolismo é reconhecido como o único critério do homem por biologistas, fisiologistas da escola pavloviana, psiquiatras e filósofos. Não é encontrado, mesmo nos principais manuais de psicologia, em conseqüência da predominância da filosofia do robô. Mas é precisamente por causa das funções simbólicas que os motivos nos animais não serão um modelo adequado dos motivos do homem, e que a personalidade humana não se completa na idade de três anos ou pouco mais, conforme julgava a teoria de instinto estabelecida por Sigmund Freud.

Provavelmente todas as noções usadas para caracterizar o comportamento humano são conseqüências ou aspectos diversos da atividade simbólica.

A doença mental é essencialmente uma perturbação das funções sistêmicas do organismo psicofísico. É por esta razão que os sintomas ou síndromes isolados não definem a entidade mórbida.

Os distúrbios psiquiátricos podem ser nitidamente definidos em termos de funções de sistemas. Com relação ao conhecimento, os mundos dos psicóticos, impressionantemente descritos por escritores das escolas fenomenológica e existencialista, são “produtos de seus cérebros”. Mas também nosso mundo normal é configurado por fatores emocionais, motivacionais, sociais, culturais, etc., amalgamados com a adequada percepção. As ilusões e os delírios, as alucinações, pelo menos em sonhos, estão presentes no indivíduo sadio.

O conceito de espontaneidade traça a linha fronteiriça. A motivação normal implica atividade autônoma, integração do comportamento, plasticidade e adaptabilidade a situações variáveis, livre uso da antecipação simbólica, decisão, etc. Isto acentua a hierarquia das funções, mostrando especialmente que o nível simbólico se superpõe ao organísmico. Por conseguinte, além do princípio organísmico da atividade espontânea o princípio humanista das funções simbólicas é fundamental na consideração da teoria de sistemas.

Portanto, a resposta à questão de saber se o indivíduo é mentalmente são ou não, é determinado em última análise pelo fato de ter ele um universo integrado consistente dentro da estrutura cultural dada.

A relatividade das categorias

Entre os recentes adiantamentos nas ciências antropológicas poucos despertaram tanta atenção e levaram a tantas controvérsias quanto às concepções expostas pelo falecido Benjamin Whorf. A hipótese proposta por Whorf é: ”que a crença habitualmente admitida de que os processos cognoscitivos de todos os seres humanos possuem uma estrutura lógica comum que opera anteriormente à comunicação pela linguagem e independentemente desta é errônea”.

A concepção de Whorf é que os padrões lingüísticos determinam aquilo que o indivíduo percebe neste mundo e o modo como pensa a respeito do que percebe.

O modo de pensar mecanicistamente articulado, que entra em dificuldade com as modernas criações científicas, é conseqüência de nossas categorias e hábitos lingüísticos específicos. Whorf espera que a compreensão da diversidade dos sistemas lingüísticos venha a contribuir para a reavaliação dos conceitos científicos.

As categorias do conhecimento, tanto do conhecimento cotidiano quanto do conhecimento científico, que em última estância é apenas um requinte do anterior, dependem primeiro de fatores biológicos, e segundo de fatores culturais. Em terceiro lugar, apesar deste emaranhamento demasiado humano, o conhecimento absoluto, emancipado das limitações humanas, em certo sentido é possível.

O conhecimento depende primeiramente da organização psicofísica do homem. Podemos referir-nos aqui em particular ao enfoque da biologia moderna inaugurada por Jacob Von Uexküll sob o nome de Umwelt-Lehre. Consiste essencialmente em afirmar que cada organismo vivo corta uma fatia do grande bolo da realidade que lhe é possível perceber e à qual pode reagir devido à sua organização psicofísica, isto é, a estrutura dos órgãos receptores e efetuadores.

O plano de organização e funcionamento de um ser vivo determina aquilo que pode se tornar “estímulo” e “característica” a que o organismo responde mediante certa reação.

Tendo indicado a relatividade biológica e cultural da experiência e do conhecimento, podemos de outro lado, indicar também os limites desta relatividade, chegando assim ao terceiro tópico enunciado a princípio.

O relativismo tem sido muitas vezes formulado de modo a exprimir o caráter puramente convencional e utilitário do conhecimento com o substrato emocional de sua definitiva futilidade. Pode-se ver facilmente que esta conseqüência não é necessária.

O mundo da experiência e do conhecimento humanos é um dentre os inumeráveis ambientes dos organismos, que nada tem de singular quando comparado ao do ouriço do mar, da mosca ou do cachorro. Mesmo o mundo da física, dos elétrons e átomos às galáxias, é um produto puramente humano, dependente da organização psicofísica da espécie humana.

No que diz respeito à experiência direta, as categorias da percepção, determinadas pela organização biofisiológica da espécie em questão, não podem ser completamente “erradas”, fortuitas e arbitrárias. Ao contrário, devem de certa maneira e até certo ponto corresponder à “realidade”, seja lá o que for esta expressão signifique em sentido metafísico. Pelo contrário, o organismo é um reagente e ator do drama. O organismo tem de reagir a estímulos provenientes do exterior, de acordo com seu equipamento psicofísico inato. Há amplitude naquilo que é apanhado como estímulo, sinal e característica. Contudo, a percepção deve permitir ao animal descobrir seu caminho no mundo. Isto seria impossível se as categorias da experiência, o espaço, o tempo, substância, causalidade fossem inteiramente enganadoras. As categorias da experiência surgiram na evolução biológica e têm continuamente de se justificar na luta pela existência. Se não correspondessem de certo modo à realidade, seria impossível a reação adequada e esse organismo estaria rapidamente eliminado pela seleção.

A maneira convincente que as formas a priori da experiência têm essencialmente a mesma natureza que os esquemas inatos do comportamento instintivo, segundo o qual os animais respondem aos companheiros, aos parceiros sexuais, descendentes ou pais, presas ou predadores e outras situações exteriores. Baseia-se em mecanismos psicofisiológicos, tal como ocorre na percepção do espaço que é baseado na visão binocular, na paralaxe, na contração do músculo ciliar, no aumento ou diminuição aparente de tamanho de um objeto que se aproxima ou se afasta, etc. As formas a priori da intuição e as categorias são funções orgânicas, baseadas em estruturas corpóreas, e mesmo análoga às das máquinas, dos órgãos dos sentidos e do sistema nervoso, que se constituíram como adaptações durante os milhões de anos da evolução. Por conseguinte, são adequadas ao mundo “real” exatamente da mesma maneira e pela mesma razão que o casco do cavalo é adequado ao terreno da estepe, as barbatanas do peixe à água. É um antropomorfismo absurdo admitir que as formas humanas da experiência sejam as únicas possíveis, válidas para qualquer ser racional. Por outro lado, a concepção das formas da experiência como um aparelho adaptativo, comprovado em milhões de anos de luta pela existência, garante haver suficiente correspondência entre “aparência” e “realidade”.

Quando se diz que a experiência deve corresponder “de certa maneira” à “realidade”, não se exige que as categorias da experiência correspondam completamente ao universo real e ainda menos que o representem perfeitamente. Basta que uma seleção de estímulos seja usada como sinais indicadores.

As categorias da percepção e da experiência não precisam refletir o mundo “real”, mas devem ser isomórfica a ele em um grau tal que permita a orientação e por conseguinte a sobrevivência.

Uma característica essencial da ciência é que ela se desantropomorfiza progressivamente, isto é, elimina cada vez mais os traços devidos à experiência especificamente humana.

Uma das funções da ciência é expandir o observável. Convém acentuar que, ao contrário da concepção mecanicista, ao usar esta expressão não entramos em outro domínio metafísico. Ao contrário, as coisas que nos cercam na experiência de todos os dias, a célula vista no microscópio, as grandes moléculas observadas no microscópio eletrônico e as partículas elementares “vistas”, de modo ainda mais indireto e complicado, por seus rastros em uma câmara de Wilson, não são de grau diferente da realidade.

De qualquer modo, porém isto conduz à eliminação das limitações da experiência impostas pela organização psicofísica especificamente humana e, neste sentido, leva a desantropomorfização da imagem do mundo.

Um segundo aspecto que se pode considerar é o que se chama convergência da pesquisa. O constante da física tem sido freqüentemente considerado somente como meios convencionais para a descrição mais econômica da natureza. O progresso da pesquisa, porém revela que as constantes naturais variam largamente na observação de observadores individuais. Em seguida, com o requinte das técnicas, o “verdadeiro” valor só é atingido assintoticamente, de modo que as determinações consecutivas alteram o valor estabelecido apenas em algarismos decimais progressivamente menores. Mas a questão é que certas constantes físicas representam certos aspectos da realidade, independentemente das tendências biológicas, teóricas ou culturais. Na verdade uma das mais importantes ocupações da ciência natural é verificar suas descobertas por meios mutuamente independentes.

O terceiro aspecto, também considerado o mais impressionante da progressiva desantropomorfização diz que o que é específico de nossa experiência humana é progressivamente eliminado. O que resta finalmente é somente um sistema de relações matemáticas.

Há algum tempo era considerada uma grave objeção contra a teoria da relatividade e a teoria quântica o fato de se tornarem cada vez mais “impossíveis de serem visualizadas”, isto é, não poderem suas construções ser representadas por modelos imagináveis.

O desenvolvimento da física depende naturalmente da constituição psicofísica de seus criadores.

A termodinâmica clássica e a estatística molecular são “linguagens” diferentes, usando diferentes abstrações e simbolismos matemáticos, mas os enunciados de uma teoria podem facilmente ser traduzidos na outra. Isto tem implicações muito oportunas.

Saber quais as características da realidade que apreendemos em nosso sistema teórico é um dado arbitrário em sentido epistemológico, sendo determinado por fatores biológicos, culturais e provavelmente lingüísticos.

É possível que formas muito diferentes de ciência, de matemática, no sentido de sistemas hipotético-dedutivos, sejam possíveis para seres que não sofrem nossas coações biológicas e lingüísticas, “físicas” matemáticas muito mais adequadas do que a nossa para tratar desses aspectos da realidade.

O mesmo parece ser bem verdade quanto à lógica matemática. Até agora, esta ciência só parece cobrir um segmento relativamente pequeno daquilo que pode ser facilmente expresso em linguagem vernacular ou matemática. A lógica aristotélica cobre apenas o campo extremamente pequeno das relações sujeito-predicado. Provavelmente apenas um campo muito pequeno do raciocínio dedutivo possível é que foi axiomatizado, mesmo pelos esforços dos lógicos modernos.

Pode ser que a estrutura de nossa lógica seja essencialmente determinada pela estrutura de nosso sistema nervoso central.

Chegamos assim a uma concepção que pode ser chamada perspectivismo. Por oposição à tese “reducionista”, segundo a qual a teoria física é a única a que toda ciência possível e todos os aspectos da realidade devam ser finalmente reduzidos, podemos admitir uma opinião mais modesta. O sistema da física é obrigatório para qualquer ser racional no sentido explicado, isto é, por um processo de desantropomorfização esse sistema aproxima-se da representação de certos aspectos relacionais da realidade. É essencialmente um algoritmo simbólico conveniente para tal propósito. No entanto, a escolha dos simbolismos que aplicamos, e por conseguinte dos aspectos da realidade que representamos, depende de fatores biológicos e culturais.

Todo o nosso conhecimento, mesmo desantropomorfiszado, só reflete certos aspectos da realidade. Se o que foi dito é verdade, a realidade é o pensamento discursivo representa sempre somente um aspecto da realidade última, chamada deus na terminologia de cusa. Nunca pode esgotar sua infinita multiplicidade. Por conseguinte, toda afirmação é válida somente de um certo ponto de vista, tem apenas validade relativa, devendo ser suplementada por proposições antitéticas partidas de pontos de vistas opostos.

Portanto, as categorias de nossa experiência e de nosso pensamento parecem ser determinadas por fatores biológicos e culturais. Em segundo lugar, esta limitação humana é rasgada por um processo de desantropomorfização progressiva de nossa imagem do mundo. Em terceiro lugar, mesmo desantropomorfizado, o conhecimento só reflete certos aspectos da realidade. Contudo, em quarto lugar, cada um desses aspectos possui a verdade, embora somente relativa. Isto, ao que parece, indica as limitações e ao mesmo tempo a dignidade do conhecimento humano.

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